(crônica de Pedro Galuchi)
Não pretendo fazer homenagem piegas, nem recompor diário de estudante.
Apenas umas pequenas lembranças.
Descobri recentemente, e sujeito a confirmação, ser o primeiro, senão o único aluno a estudar onze anos consecutivos, sem reprovação, no Colégio Brasílio Machado, no prédio da Rua Afonso Celso, 311
Em 1962, ingressei, às escondidas e sem matrícula oficial porque a classe estava lotada e eu não tinha sete anos, no Curso Primário Anexo ao Colégio Estadual e Escola Normal Brasílio Machado.
A gravatinha dos meninos e o vestidinho das meninas tinham a logomarca CEEN, que cheio de vergonha, dizia-se ser Cuidado! Estou Esperando Namorado ou, pior, Nenê.
De óculos, calças curtas e cabelinho cortado só a franjinha – igual o Ronaldinho, outrora fenômeno – já estava alfabetizado e caí nas graças da professora Coraly Nunes.
Logo a diretora, dona Creuza, regularizou minha situação.
Modéstia a parte, até porque a modéstia é minha segunda virtude, logo após a primeira, que é a pequena somatória de todas as outras, fui um dos melhores alunos não só na primeira série.
Sabia ler tudinho o que estava escrito na Cartilha Caminho Suave, da Branca Alves de Lima e tabuada tirava de letra.
Depois foi fácil, acho.
Entre uma brincadeira e outra no pátio, ia passando de ano.
Donas Lourdes, Geny, Isabel, Luiza, professoras das séries seguintes onde andarão?
Tínhamos tratamento dentário com o Dr. José Carlos, as normalistas faziam teatrinhos conosco.
Ganhávamos medalhas por bom comportamento e por fazer a lição de casa.
Lembro que um dia não tirei uma nota cem, porque estava com pressa e obviamente seis vezes oito se tornaram setenta e dois.
Depois o exame de admissão.
Que medo!
Qual o quê?
Lá estava eu, magrinho e pequeninho no meio de um monte de marmanjão, cheio de orgulho por usar calça comprida e estar num dos cinco melhores colégios de São Paulo.
Se me lembro eram o Caetano de Campos (Praça da Republica), o Presidente Roosevelt, o Alberto Levy (Indianópolis), o Brasilio e o Zuleika de Barros (Sumaré).
Professor Margarido, diretor da escola, em 1966, decidiu transferir todos os meninos e tive que estudar lá longe na Rua dona Julia, na extensão instalada no Marechal Floriano, onde se “entrava burro e saia baiano”.
O prédio da Afonso Celso ganhou o apelido de Convento.
Um ano de batalha dos pais e estávamos, os melhores alunos da extensão, de volta ao prédio central.
Uma classe só de meninos, no período da manhã.
Naquela época não havia classes mistas no Ginásio.
Segunda série do Ginásio, meu primeiro exame final.
Não consegui fazer os 49 pontos em Ciência e tive que decorar todos os 108 ossos do corpo humano.
Devem ter descoberto mais, mas felizmente eram só 108 naquela época.
O perônio virou fíbula, mas lembro do osso hióide e do músculo esterno-cleido-mastóideo até hoje.
O professor Antonio judiou da gente.
Aprendia-se taquigrafia, espanhol e francês. O Latim já havia sido excluído.
As meninas tinham puericultura e artes.
Aulas de música.
Quarta série do ginásio, outra decisão difícil.
Cientifico, clássico ou normal?
Justamente no meu ano o clássico e o científico se fundiram, o curso primário foi suprimido e os alunos que sobraram da limpeza feita pelos professores, deu num pinguinho de meninos no primeiro colegial em 1971, no Instituto de Educação Brasilio Machado.
Explico.
Era época do estêncil e um professor mais avançado já se valia da cópia heliográfica.
O funcionário da copiadora era amigo de um aluno e passava as provas para ele e este distribuía para seus amigos.
Os alunos mais bagunceiros da classe íam bem nas provas, enquanto os quietinhos, inocentes, tiravam notas abaixo da média.
A trama foi descoberta no dia que o professor disse que as cópias não tinham ficado prontas e iria passar as perguntas na lousa e ouviu alguém falar baixinho: “A prova está diferente!”
Esclarecida a situação foi feita a “limpeza étnica” pelo conselho de classe que reprovou a turma de falsários e convidou-os a se transferirem compulsoriamente.
Assim, os poucos adolescentes que sobraram, uniram-se a alguns que aguardavam na fila uma matrícula no Brasilio e às meninas que queriam estudar de manhã.
Irresistível dizer que a piada era que elas estudavam de manhã para ajudarem as mães a lavar roupa e cuidar da casa à tarde.
Namoricos, paqueras, festivais de música e o colegial passou voando.
Vestibular, todo mundo seguindo sua vida e se afastando do Brasilio.
Estarão vivos os professores?
Por onde andará o palmeirense professor Clóvis Alcides Campolli, cujo trabalho me influenciou a seguir para a Educação Física, quando todos achavam que eu seria engenheiro ou médico e diziam: “Educação Física, mas você é tão inteligente?”
O Professor Helio dos Anjos Menegon sei que se aposentou e continua indo quase diariamente, até a Escola Estadual Brasilio Machado. Certo dia, deu-me uma advertência e mandou-me para a diretoria porque me viu entrando pela janela.
Não acreditou quando disse que tinha ido pegar a bola que havia caído no telhado.
Só no dia seguinte tudo se esclareceu quando pedi ao Clovão que falasse com ele e limpasse minha barra.
Poderia descrever os teoremas da Professora Graciosa e o dia em que sua irmã, a professora Erina (Geografia), rasgou as provas de todos que haviam feito cola nas carteiras e obrigou a raspá-las com vidro e envernizar tudo.
Escapei dessa...
Minha cola estava na lousa lateral.
Agora, se não gostaram da descrição e do texto, culpem, em parte, os professores Mariano e Amílcar Martins Varanda, apesar da “chatice” deste ao conferir se tínhamos feito a lição de casa no caderno brochura com capa de plástico, onde não podíamos arrancar páginas e encher a paciência com as conjunções sindéticas, subjuntivas que tínhamos de saber sem alternativas, senão que se fazer.
O que e o se tinham dezenas de funções e a nossa função era estudar.
Ele me despertou o interesse pelos sonetos simbolistas e pela escrita em geral.
Azar ou sorte de vocês que leram umas pequenas passagens de minha vida em onze anos que passei por lá.
No Curso Primário Anexo ao Colégio Estadual e Escola Normal Brasilio Machado.
Está certo o cabeçalho, professora?
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2 comentários:
Sabe pq. não sou professora de periferia.... pq. eu estudei no "Presidente Roosevelt"!!!! Adorei o texto pricipalmente a descrição do uniforme! e das mudanças que ocorriam.Abraços!
Eu fui aluna do Brasílo Machado de 69 a 75, infelizmente não me lembro de você, depois de 35 anos não lembro de ninguém, alguns professores que você mencionou, Dona Graciosa, era ela quem tinha a lingua presa? Menegon era prof de física ou era o de português que usava uma bengala e sentava a dita na mesa quando havia muito barulho? Lembro da Dona Horacina de história, a que usava massa corrida no rosto, mas era gente boa, todos eles eram e perto dos alunos de hoje nós eramos santos.
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