O menino começou a acreditar em fantasmas numa noite
em que ninguém soube explicar por que a cortina balançava, sem que houvesse
vento na janela. Por misterioso paradoxo, quando uma brisa passou pela janela, a
cortina parou de balançar.
Em seu raciocínio crédulo e simplista, concluiu que a
brisa era um fantasma saindo da casa. Naquela noite quente, tremeu muito antes
de, cansado de tanto relutar com o sono, adormecer.
Não sem antes fechar a janela.
Daí em diante, todas as noites conferia,
desconfiado, o balanço da cortina. Abria e fechava a janela, olhava debaixo da
cama e em sua oração noturna pedia que o fantasma não viesse assustá-lo.
Medo de fantasmas é realmente paradoxal.
Há pessoas que não pregam os olhos, madrugada a dentro,
temerosos ao surgimento de um. Ignoram que fantasmas só costumam aparecer quando
menos se espera.
Outras fecham os olhos a noite inteira para não ver
os fantasmas. Apesar de algumas dessas pessoas jurarem de pés juntos, não
acreditarem nessas “bobagens”, sabem que eles estão ali quietinhos em seu canto
e, quando querem, aparecem na forma de pesadelos.
Há fantasmas em toda parte.
Todos têm seu fantasma de estimação.
Nem que surja na forma de uma prova de química orgânica
ou de óptica.
Recentemente, até o futebol aceitou sua existência e
instituiu o “Fantasma do Rebaixamento”.
Os vivos, talvez ignorando serem apenas futuros fantasmas,
criaram um local apropriado para a coexistência pacífica;
No fundo queriam que os fantasmas ficassem reclusos.
Deram-lhe o imponente nome de Necrópole – “Cidade
dos Mortos”. Regulamentaram que os fantasmas poderiam circular livremente na
Necrópole.
À noite.
De dia, dormiriam.
No começo tudo parecia resolvido.
Mas, os fantasmas logo rebelaram-se.
Se vivos podiam fazer visitas na Cidade dos Mortos
de dia, incomodando seu descanso, os fantasmas também podiam sair pela Cidade
dos Vivos à noite.
Nada mais justo!
Assim o fazem.
Fantasmas são espertos. Cientes de sua
invisibilidade, entram em tudo que é lugar. Veem o que ninguém imagina. Sabem
de tudo o que acontece.
Parece 1984.
Todo cuidado é pouco!
Quando resolvem abrir o bico...
Psicografam...
Reza a lenda, exista um setor de censura no mundo
dos fantasmas.
Um código de ética: “Você não conta meus podres, eu
não conto os seus”.
Assemelha-se, no mundo dos Vivos ao “Fantasma da Delação
Premiada”.
E os segredos de família?
Fantasmas sabem mais que fofoca de vizinha.
Língua de sogra é café pequeno.
Veem coisas de arrepiar padre em confessionário.
De deixar o Cão à espera de alguns santos vivos para
tirar férias.
Como eu sei disso tudo?
Sabe aquele menino assustado com o balanço da
cortina?
Era eu...
Em vida...
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Nota do Autor:
Espero que este texto tenha sido psicografado.
Senão, morri e nem notei.
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